11 de abr. de 2023

"Astrologia Racional" - O Livro

Astrologia Racional absorvendo a galáxia inteira - BRABO!
Astrologia Racional absorvendo uma galáxia inteira - BRABO!
(extraído de https://www.uniastro.com/single-post/bibliadosastrologos)

Não tenho provas, mas o relato oral de um colega pode ser algo suficiente para ilustrar meu ponto de vista. Esse livro fazia parte da bibliografia recomendada para se fazer uma prova que, caso passasse, faria da pessoa um membro do Sindicato dos Astrólogos do Rio de Janeiro. 

Trata-se do Astrologia Racional, do Adolfo Weiss. 

Breve biografia (astrológica) do autor

Adolfo - originalmente, Adolf - Weiss, um médico austríaco naturalizado argentino, nasceu numa daquelas cidades que mudaram de país várias vezes. A cidade de Wroclaw hoje pertence à Polônia mas, várias vezes, ela foi parte do Reino da Polônia, do Ducado da Boêmia, do Reino da Hungria, da monarquia Habsburgo da Austria, do Reino da Prussia e da Alemanha! Tudo isso sem sair do lugar. 

Wroclaw se tornou parte da Polônia novamente em 1945, como parte dos Territórios Recuperados, o resultado de extensas mudanças territoriais da Polônia imediatamente após a Segunda Guerra Mundial. À época do seu nascimento, em 1888, Wroclaw se chamava Breslau e pertencia à Prússia. 

Adolf foge da então Alemanha em 1938, quando os estertores de uma guerra se anunciavam*. Tecnicamente, a 2ª Guerra começa com a invasão da Polônia pela Alemanha em 1939. Contudo, em 12 de março de 1938, a Áustria era anexada pela Alemanha nazista, um fato perfeito para quem adorava fazer previsões sinistras - e provavelmente, Adolf fez muitas - ficar com o c% na mão. 

Após sair da Alemanha, ele se instala no Brasil, mas depois migra para a Argentina, ficando em Buenos Aires até a morte, em 1956, por um ataque cardíaco. Abaixo, temos a sua natividade:

O mapa de Adolf Weiss é classificado como B, indicando que a data e horário não são da certidão, mas declarados pela própria pessoa, através de relatos ou de biografia. 

Minha hipótese é a de que o rigor de Adolf era grande e ele não usaria um horário sem se certificar de que estaria minimamente próximo do horário real. Portanto, vale a pena dar uma conferida. Mas mesmo se esse mapa for uma ficção minuciosamente elaborada por um astrólogo experiente, ele ilustra princípios astrológicos que podem ser vistos em mapas mais confiáveis. 

Só de sacanagem, coloquei nesta figura um lote moderno - que usa no seu cálculo um planeta transaturnino. Chama-se "astrologia", e é calculado tomando-se a distância entre ♅ e ☿ e projetando-a do Ascendente. Como Weiss tem ☿ ☌ ♅, ele tem esse lote conjunto ao Ascendente! E isso explica muito bem a grande motivação deste indivíduo em disseminar a cultura astrológica ao público, obtendo status de realeza com isso, porque o regente do lote é ♄ em ♌ na Casa 7! Astrólogos modernos diriam que ♅ rege o Ascendente e está na 9 significando a motivação em publicar livros. Eu não uso regências para ♅, ♆ e ♇.

Todas as pessoas que nasceram no mesmo dia de Adolfo terão o Lote da Astrologia conjunto ao ascendente, porque vai demorar alguns dias um se afastar do outro. Entretanto, nem todas os nascidos no mesmo dia tiveram o interesse pelo assunto. Precisamos ver se alguma coisa específica do horário de nascimento justifica essa ativação tão vívida dos assuntos do lote, e temos: neste horário, o lote é aspectado 1)pelos planetas que compõem sua fórmula e 2)pela regente da casa 9, que possui relação com os significados do lote. E todos eles estão em conjunção na casa 9, que significa astrologia!  

Sem dúvida, Adolf(o) foi um exímio autor e astrólogo, que influenciou a formação de vários astrólogos de língua inglesa, espanhola, e portuguesa. 

A migração para a América do Sul ocorre em 1938. Infelizmente, não sabemos se ela ocorre antes ou depois do aniversário - o que impossibilita o uso das profecções. Mas algumas direções primárias são interessantes para mostrar como ele viveu aquela época:


No ano da migração para a América do Sul, Adolf tem a direção de Algol ao Ascendente - algo que deve tê-lo deixado assustado. Talvez ele desconhecesse as partes árabes que significam viagens, mas ao redor de 1938, duas delas estavam indicando viagens inadiáveis - o lote das viagens e o lote das viagens por água, ambas em aspecto ao Lote da Fortuna. 

A forma da obra.

Reparou na grossura do livro da foto no início do artigo? O livro Astrologia Racional é uma tradução para o espanhol do livro Der Blausteine der Astrologie (algo em alemão como "As pedras fundamentais da astrologia"). Era um tratado de astrologia em cinco volumes, lançados entre 1925 e 1927. Esses volumes ainda são vendidos, espalhados, por sebos alemães na internet. 

As primeiras edições tem capas com uma influência bem abstrata, puro suco da década de 20 (lembra o estilo de Kandinsky, um dos professores da Bauhaus):

Quando Adolf migra para a Argentina e passa a se chamar Adolfo, publica pela editora Kier os cinco volumes condensados num tolete de quase 900 páginas - embora exista uma edição que divida o tratado nos seus cinco volumes originais. Lá, o livro ganha seis edições: 1946, 1965, 1973, 1977, 1982, 1987 e 1993. 

Eu tenho a edição que divide esse tolete em duas ou mais partes. Das cinco, adquiri duas partes: uma com cálculos, outra com princípios de interpretação. A minha edição está caindo aos pedaços, com páginas cheias de buracos de traças - possivelmente se trata da primeira edição, a de 1946, e nem sei mais onde ela está. Comprei de teimoso. Por ignorância, achava que o livro se resumia a apenas essas duas partes. Provavelmente, essas duas partes eram as mais populares - tem muita gente que jura ter lido e praticado o tijolo inteirinho, mas pelo modo como se praticou astrologia nas décadas de 80 e 90 no Brasil (quase ninguém usava direções primárias), eu duvido muito. 

Não li a edição completa, e acho que vou comprar uma edição mais recente, de preferência completa e sem cheiro de mofo. A maravilhosa editora argentina Kier, repleta de livros de astrologia interessantíssimos, vendo a falta de interesse do público contemporâneo, cancelou as reedições desta obra prima há alguns anos. Enquanto isso, a Kier ainda publica Stephen Arroyo e Liz Greene até hoje. Não culpo a editora, ela precisa se manter de pé. Para isso, precisa publicar aquilo que venda - e essa é a prova de que a demanda popular pode ser uma verdadeira merda. 

Alas, não temas! Esse livro se acha facilmente na internet.

Uma pequena edição inglesa (mas sem nada de novo)

Em língua inglesa, Adolf faz uma pequena e elogiosa aparição. O nome "Der Blausteine..." foi traduzido literalmente para inglês como "Cornerstones of Astrology", um livro muito bom e o único texto disponível de Adolf Weiss e Fredrich Schwickert em inglês - até onde a internet me permite saber. 

Na verdade, o livro em inglês não passa da tradução do volume entitulado "Síntese" do Der Blausteine de Astrologie (que pode ser visto com a capa rasgada no trio de livros da foto anterior, à direita), que diz respeito às regras de interpretação segundo Morin de Villefranche, sendo que o livro em inglês é raro de se encontrar - um daqueles gratos momentos em que nos damos conta de: para que procurar por algo raro em inglês que temos em espanhol na internet de graça?

O conteúdo da obra

Os cinco volumes do Der Blausteine foram escritos na década de 20. Um tratado totalmente dedicado ao estudo e prática da astrologia, sem firulas. E o melhor: traduzido para um castelhano de fácil compreensão pelo nativo de língua portuguesa, a prosa é para quem não tem pressa - sugiro que você dê tempo ao desenvolvimento das ideias, com calma, pois lhe será muito recompensador.  

O conteúdo do livro é deveras interessante:



Especial atenção eu tenho à quinta parte, principalmente ao capítulo V, sobre direções mundanas com paralelas raptas, e ao capítulo XI, com a teoria de Morin sobre trânsitos - acredite, é difícil achar literatura a respeito.

Em resumo... Se você estiver começando, esse é o livro. Em geral, o livro é tão bom que qualquer deficiência teórica é facilmente suplantada a posteriori.

Weiss é tradicional.

O livro foi escrito na década de 20, quando Plutão ainda nem tinha sido descoberto! Entretanto, edições subsequentes argentinas suplantaram essa deficiência colocando as características do planeta. Mas os planetas além de ♄ não alteraram em nada o esquema que Weiss vinha seguindo: apesar de incluir as características simbólicas dos três planetas transaturninos, ele ainda recomenda ao leitor o uso das regências tradicionais (♒ regido por ♄, e não ♅, ♓ regido por ♃, e não ♆, ♏ regido por ♂, não ♇).

Apenas por saber isso e por dar uma olhada no índice já me mostra que o autor é, de fato, tradicional. Usar direções primárias é algo típico de quem viveu no século XX mas não se contaminou pelas discussões filosóficas do debate astrológico à época. 

Mas não é só isso. Basta ler os exemplos de interpretação dados por Adolf na sua obra para perceber que o buraco é bem mais embaixo: Apenas o uso de ♅ ♆ e ♇ por um astrólogo não é critério para se chamá-lo de moderno. É preciso mudar também o que se procura na interpretação. 

Exemplo de interpretação tradicional versus moderna (e no mesmo trânsito)

A interpretação tradicional não coloca todos os eventos astrológicos encontrados em técnicas preditivas voltados para representarem aspectos subjetivos da vida do indivíduo analisado. Embora o nativo tenha cadeira cativa no meio do mapa para observar o que acontece ao seu redor, as coisas não giram em torno dele. Essa característica está presente na obra de vários astrólogos do século XX, sendo Weiss o seu maior expoente, na minha opinião.

Um exemplo no qual isso fica muito claro foi quando eu tive um trânsito de ♇ sobre ☿ na 12 natal, em 2004. ☿ rege as casas 3 (irmãos, vizinhos, parentes) e 6 (doença, trabalho) do meu mapa. 

A interpretação do aspecto, como escrita no Solar Fire:

Plutão em trânsito Quadratura Radix Mercúrio

As comunicações verbais e escritas podem ficar tensas durante esse período, pois seus pensamentos e emoções estão desequilibrados. Você carece de clareza mental, pois os problemas emocionais estão de alguma forma obscurecendo seus processos de pensamento. Portanto, é melhor tentar manter seus pensamentos para si mesmo. Você pode descobrir, no entanto, que sua língua foge de si mesma e você involuntariamente fere os sentimentos de outras pessoas. Também pode ser que outra pessoa esteja incomodando você por falta de tato e diplomacia. Quaisquer que sejam as circunstâncias, é melhor tentar conter quaisquer pensamentos obsessivos e abordar os problemas de forma imparcial sempre que possível.

Um astrólogo moderno diria que este trânsito representa pensamentos obsessivos ou quaisquer outras coisas envolvendo a simbologia dos dois planetas, normalmente manifestadas como uma experiência subjetiva vivenciada pelo dono do mapa. De fato, minha mente ficou meio perturbada à época, devido a uma desilusão amorosa - nada que me rendesse uma internação psiquiátrica ou prejudicasse minhas atividades.  Mas essa é apenas metade da história. O símbolo astrológico é polissêmico. Ele pode não se referir a apenas uma área da vida, a apenas uma dimensão da existência. 

Plutão simboliza morte, e essa foi uma época na qual eu via morte ao redor, dentro dos significados de ☿. Na mesma época, um vizinho de infância descobriria um câncer pulmonar agressivo, morrendo em menos de dois meses; meu tio morreria de uma metástase pulmonar por câncer de pele** e meu irmão voltaria a ter ataques de pânico ao constatar que não queria cursar a faculdade na qual ingressara há alguns meses! 

Insisto que Weiss é tradicional, apesar de algumas distrações

Alguns elementos empregados por Weiss que também são empregados pelos astrólogos modernos, na verdade, já existiam desde a Renascença: lendo melhor este livro, você se surpreenderá  com exemplos de direções primárias de planetas em sesquiquadratura, mas não se engane: esses aspectos já eram usados desde o século XVII. 

Como todo astrólogo esforçado, Weiss queria emular a teoria e as práticas dos seus mestres, pensando que essas coisas fossem o estado da arte na astrologia - e de fato, na época em que esse livro foi escrito, era mesmo. O mestre de Weiss era ninguém menos que Morin de Villefranche, que foi redescoberto pelos astrólogos do século XIX e XX com a tradução do seu livro 21 do Astrologia Gallica no século XIX. Há trechos nas obras de Morin e de William Lilly onde se mencionam esses aspectos menores. 

Talvez isso lhe traga um questionamento: se esses aspectos são usados desde o século XVII, por que usá-los agora seria coisa de astrólogo moderno? Porque não é o uso do aspecto, mas o que se faz com ele, que determina se um astrólogo é moderno ou não

Mais tarde, no mesmo século que Weiss viveu a maior parte da sua vida, outros astrólogos darão uma abordagem cíclica aos aspectos menores, considerando-os como estágios evolutivos dentro de um ciclo envolvendo um par planetário - uma doutrina da Astrologia Humanística de Dane Rudhyar. Por exemplo, o aspecto de sesquiquadratura (135˚, símbolo "⚼"), nesta abordagem, passa a ser considerada um estágio no qual a pessoa percebe uma frustração envolvendo os significados dos planetas em aspecto.

Notas de rodapé

* Tendo saído da Alemanha antes da guerra, e não depois, suponho que ele não era simpatizante do regime nazista - a menos que estivesse fazendo espionagem na Argentina, o que não me parece muito plausível. Por isso senti um certo alívio. Nazista ou não, pra mim tanto faz - sou daqueles que se importa com o conteúdo da obra, e não com o caráter. Mas isso ajuda a afastar problematizações de gente chata no futuro - coisas do tipo "ele recomenda livro de nazista!".

** Além do meu tio ter morrido, o marido da minha prima, dois dias depois do enterro do meu tio, teve um infarto fulminante. 

Biografia

https://www.astro.com/astrowiki/de/Adolf_Weiss

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