2 de set. de 2025

Tudo que você pode aprender sobre os ângulos de um mapa astral

O termo "Centro" vem do grego Kentron. Foi levado à Índia por intermédio das rotas comerciais criadas por Alexandre, e transliterado para o Sânscrito como "Kendra".

Kendra é usado frequentemente pelos Jyotishis (astrólogos da Índia ou seus seguidores mundiais), assim como Apoklima (as Casas Cadentes) e Panaphara (Sucedentes). Todos termos de origem grega.

No Sânscrito, a etimologia do termo "Kendra" não vai além do "empréstimo" da língua helênica. Não há nada na cultura indiana que se refira a este termo além dele representar os Ângulos de um mapa astrológico. No Grego, acontece o oposto. Há elementos quotidianos da cultura helênica definidos por esta palavra, e são desses elementos da vida quotidiana grega que se retiram os significados para o conceito astrológico.

No mundo helênico, Kentron era um instrumento pontiagudo usado para tocar o gado que levava o arado. O gado era espetado pelo Kentron, se assustava e avançava pelo campo. O boi, outrora parado, preguiçoso, voltava a se ocupar.

Essa analogia é perfeita para entender que planetas ocupando os Kentroi (plural de Kentron) estão ocupados, mas seja bem claro nas definições! Diferentemente do que os astrólogos dizem por aí, estar ocupado pode ser diferente de estar forte! Força em qual sentido?! Depende muito da definição de força. Se os Kentron representam algum tipo de força, é apenas a força de se manter ativo e ocupado! Eu mesmo me considero uma pessoa fraca e tenho me ocupado consideravelmente nos últimos meses.

Ao mesmo tempo, o kentron é até hoje usado nos compassos, para traçar circunferências. Ele é a agulha do compasso, e daí que vem a significação de "Centro" ou "Central". O centro da circunferência fica onde a agulha finca o papel. 

Todo o movimento do compasso depende deste ponto. Da mesma forma, tudo gira em torno dos Centros. Os signos angulares são os centros. Os signos sucedentes se dirigem aos centros. Os signos cadentes se afastam dos centros.

É dos Centros que partem os significados de quase tudo representado pelas Casas ou Locais. Um entendimento correto disto pode dar liberdade ao astrólogo de saber localizar qualquer tema dentro de uma carta, seja natal, horária ou mundial.

Os árabes também herdaram a significação dos ângulos de um instrumento pontiagudo. Chamavam os Centros de أوتاد (awtād), ESTACAS. Como se os ângulos fossem estacas que fincam as pontas das tendas no chão (e as mantém de pé).

O paradoxal movimento dos Centros

O centro de um compasso não se mexe, mas os centros/ângulos celestiais sim, e de uma forma um tanto estranha. Acontece neles um tipo de movimento interessante e ignorado por muitos.

Ao longo do dia, o ângulo do Ascendente oscila mais ao norte e mais ao sul, em torno do ponto cardinal Leste. O Ascendente e Descendente podem ser mais ao norte ou mais ao Sul do Leste/Oeste Geográficos.

É um movimento complexo de se descrever, mas podemos vislumbrá-lo com a facilitação dos programas de Astrologia. Basta colocar nos mapas dos softwares de astrologia o ponto extra chamado EAST POINT (EP) ou EQUATORIAL ASCENDANT (EA) e avançarmos o mapa no tempo: veremos que o Ascendente que nós conhecemos, ao longo do dia, vai oscilar em torno do EA, ficando acima ou abaixo deste ponto, na ordem dos signos. É o Ascendente "sambando" em torno do Leste!

Felizmente, também podemos entender esse movimento facilmente através desse vídeo:

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A Linha do Zodíaco é a vermelha. Note como ela se move em relação ao Leste, representado pela letra "E".

Mas isso não ocorre com o Meio do Céu...

A imobilidade horizontal do Meio do Céu

O meio do céu (Mc), chamado pelos Gregos de μεσουράνημα (mesouránēma, meso = meio, ouranos = céu), é o encontro do Meridiano com o Zodíaco.

O meridiano local é um grande círculo que liga o Norte geográfico ao Sul geográfico, passando pelo zênite (ponto acima da cabeça) e pelo nadir. Onde a eclíptica/zodíaco cruzar este círculo, ali é o Meio do Céu.

O Meio do Céu não balança como o Ascendente. Ele não balança horizontalmente, mas oscila "verticalmente", (em altitude), parecendo mais alto ou mais baixo ao longo do dia. É o que se pode ver no exemplo abaixo. A linha verde é o meridiano, enquanto o Zodíaco é a linha vermelha. Onde elas se cruzam, é o "Meio do Céu".



Perceba que a altitude do Meio do Céu muda ao longo do dia. Logo, a conclusão óbvia é que nem sempre o Mc será o ponto mais alto do céu, tampouco do Zodíaco! Isso acontece por causa da inclinação da eclíptica em relação ao horizonte e da latitude do observador.

Algumas implicações da imobilidade do Meio do Céu.

Se usarmos o Ascendente como o paradigma do que deve ser um Kentron, como devemos conceber o Meio do Céu? 

Em outras palavras: usando o Ascendente como referência, o Meio do Céu seria considerado um Kentron? Resposta: depende do referencial:
  • Se considerarmos que um Kentron deve se portar da mesma forma que o Ascendente, a resposta é não. O meio do Céu, como vemos, não se comporta como o Ascendente. Ele não "samba" ao redor do Meridiano, ele é o cruzamento da eclíptica com o Meridiano. 
  • Se considerarmos que o Ascendente não é paradigmático para definir qualquer ângulo, a resposta pode ser entre "sim" ou "talvez", a depender do referencial.
Há um segundo questionamento que se deriva do anterior: Existe alguma coisa ao redor do Meridiano, próximo à sua maior altitude, que pode se comportar da mesma forma que o Ascendente ao redor do Leste? Se o Ascendente gira em torno do Leste, o que gira em torno do meridiano? 

Sim, senhores, este ponto existe! Simplesmente o Ponto do Zodíaco que se comporta da mesma forma que o Ascendente e "samba" ao redor do Meridiano, (da mesma forma que o Ascendente "samba" ao redor do Leste) está a 270˚ de longitude zodiacal do Ascendente. Ele foi traduzido por Robert Schmidt como Place at the Peak, "local no pico", simplesmente a quadratura à direita do Ascendente. Assim como o Ascendente oscila em torno do Leste, o Local no Pico oscilaria em torno do meridiano, onde reside o Meio do Céu.

No sistema de Casas Iguais, que atribui o mesmo grau do Ascendente para todas as cúspides de Casas, o Local no Pico (ou apenas Pico) é simplesmente a cúspide da casa 10, como no exemplo abaixo:


Perceba que o Meio do Céu está quase no meio da Casa 10. A cúspide da mesma faz exatos 270˚ com o Ascendente - é o pico.

Agora veja uma coisa interessante. Vamos olhar exatamente o mapa acima, mas num programa de observação astronômica, o Stellarium:


Este mapa mapa tem uma grade azimutal. Nessa grade, o ponto mais alto do céu está na circunferência central, a bolinha menor. Quanto mais periférico na figura, mais baixo o ponto analisado.

Vamos comparar a altitude do Meio do Céu com a altitude do Pico. Basta ver quem está mais próximo da bolinha.

Como sabido, o Meio do Céu é o encontro da linha verde com a vermelha (zodíaco). Mas onde está o Pico? Ora, sabemos que ele está à direita do Meio do Céu e também faz parte da linha vermelha. Note que à direita do Meridiano (linha verde), a linha vermelha fica mais próxima do centro do mapa - ainda que seja uma diferença discreta.

Parabéns. Você acabou de ver que o Pico é assim chamado por realmente ser o local mais alto da eclíptica do céu em um dado momento.

Argumentos meia boca

Todo o exposto acima nos mostra que, assim como qualquer elemento da astronomia, os centros também são móveis. O Ascendente "samba" em relação ao Leste, o Pico "samba" em relação ao Meridiano e o Meio do Céu oscila sua altitude. Mesmo sendo móveis, são centrais, já que marcam regiões importantes de cruzamentos no céu.

Então cuidado com algumas eventuais argumentações que possam surgir por aí, baseadas em premissas astronômicas e etimológicas incompletas. Vamos simular aqui uma delas. O que vem a seguir não é o que eu penso, mas pode ser uma linha de argumentação a ser vista por aí:
Se os gregos chamavam as casas de Locais (Topos), e se os Locais, do ponto de vista do homem, são fixos no espaço, então isso significa que as casas devem se constituir em divisões fixas do espaço celeste. Divisões celestes que dividem o tempo ou o espaço celeste em porções fixas, como Placidus, Regiomontanus, Campanus, etc seriam escolhidas como sistemas de casas coerentes, ao invés do sistema de signos inteiros, que é uma simplificação grosseira da realidade astronômica, dada a precariedade em que vivia a maioria dos astrólogos do período helenístico. Pela mesma razão, devemos usar o Meio do Céu como a cúspide da Casa 10, porque ele é fixo no espaço. 
Não consigo pensar desta forma porque tal argumentação cai por terra quando aplicada ao Ascendente! Como vimos, o Ascendente não é imóvel! Ele "samba" em torno do Leste! E até mesmo o Meio do Céu não pode ser considerado totalmente imóvel, porque ele oscila em altitude!

Qualquer argumento de fixidez espacial cai por terra quando nos lembramos de que espaços são predominantemente fixos, mas podem ser móveis! Se eu moro num trailer, o local onde moro é móvel! Ao mesmo tempo, estamos vivendo num planeta que, para nós, parece ter sua superfície imóvel, mas que orbita em torno de uma estrela!

O que diz a filosofia do período sobre espaços móveis?

Em Platão, especialmente no Timeu, o espaço (chôra) aparece como um receptáculo vivo, uma espécie de matriz que recebe as formas e participa do movimento. O chôra não é simplesmente fixo: ele acolhe e sofre as transformações do devir, sendo, de certo modo, um “lugar móvel” que oscila entre o inteligível e o sensível.

Aristóteles, ao contrário, na Física, recusa essa noção de espaço fluido. Para ele, o lugar (tópos) é o limite imóvel do corpo que contém outro corpo: o espaço em si não se move, é o corpo que transita de um lugar a outro.

Assim, enquanto Platão concebe o espaço como algo dinâmico e instável, Aristóteles fixa a categoria de lugar como estável, transferindo toda a mobilidade apenas ao movimento dos corpos.

Como a astrologia foi supostamente alicerçada predominantemente por integrantes do Platonismo Médio, não seria absurdo pensar que os ângulos não seriam resultantes de divisões arbitrárias que ficariam imóveis no globo celeste.

Consideração temporal do Meio do Céu e um questionamento.

Estamos cansados de saber que o Ascendente é importante pelo fato de ser o local onde a eclíptica/zodíaco cruza com o horizonte. Muitas vezes, ele é erroneamente encarado como o próprio leste. Entretanto, como o Leste Geográfico é um conceito muito importante, por que ele nunca foi levado em conta como um ponto a ser interpretado? 

A resposta é auto evidente. Por mais que o Ascendente não se alinhe com o Leste o tempo todo, ele é importante por ser onde está a eclíptica: e é ao redor da eclíptica (ou nela mesma) que ficam os planetas. Portanto, o Ascendente é o local do horizonte mais perto de onde se contempla a "ação" dos planetas, e este local nem sempre recai sob o Leste. 

O Meio do Céu, entretanto, não se comporta como o Ascendente. E alguns dirão que esta é uma informação de importância interpretativa muito grande: Porque o Meio do Céu só oscila em altitude, nada mais adequado para ser o ponto para monitoras as oscilações de status social do indivíduo. 

Mas existe outra informação astronômica interessante do Meio do Céu. Quando o Sol o cruza, esse instante é o meio-dia verdadeiro* — o Sol já percorreu metade de seu caminho diário (de nascente a poente) em relação ao horizonte. 

Da mesma forma, o dia nasce quando o Sol nascia no Ascendente. E esta será a única correspondência entre o Meio do Céu e o Ascendente: ambos representam a passagem do tempo.

(*Não se confunda: o meio dia verdadeiro só coincide com o meio dia do relógio quando as horas locais se igualam às horas equatoriais, e isso acontece apenas quando a duração do dia for igual à noite, nos Equinócios).

Conclusões temporárias

Com tudo que vimos, podemos chegar a algumas conclusões temporárias. 

O Ascendente:
  1. Oscila em torno do Leste, mais para norte ou mais para o sul.
  2. Quando o Sol está ali, o dia começa.
Já o Meio do Céu:
  1. Não tem a oscilação similar ao Ascendente
  2. Não é o local mais alto do mapa, como muitos falam por aí.
  3. tampouco é o local mais alto do zodíaco
  4. A única coisa em comum com o Ascendente é representar a passagem do tempo. Quando o Sol está ali, é meio dia.
Por outro lado, o Pico:
  1. Se comporta da mesma forma que o Ascendente, oscilando em torno do Meridiano.
  2. É o local mais alto do zodíaco no mapa.
    1. Quando o Sol está ali, não tem nenhuma consideração particular, além de estar no local mais alto do mapa (e, portanto, teria uma simbologia para status muito mais evidente que o Meio do Céu).
Em termos de analogia, vê-se que o Meio do Céu não pode ser análogo ao Ascendente. São "animais" distintos, se comportam de formas diferentes. Tem coisas em comum, da mesma forma que cães são parentes dos lobos. E talvez por isso o Meio do Céu tenha uma função diferente do Ascendente ou de qualquer outra cúspide relacionada a Casas. 

Normalmente se diz que o Meio do Céu é a cúspide da Casa 10, mas isto pode ser uma grande confusão histórica. Talvez a cúspide da Casa 10 seja o "Local no Pico".

Já o meio do Céu seria usado para outras questões, bem específicas. Há quem defenda o uso do Meio do Céu para considerações temporais, como por exemplo no tópico da escolha do Predominador, também chamado de Hyleg. Mas este tópico é um pouco mais avançado e requer laudas e laudas de argumentações e citações.

Existem uma série de questões que ainda não me sinto à vontade para resolvê-las. Queria pontos de vista alternativos, desde que embasados em material consistente, e não meras epifanias. Infelizmente, receio que o exposto aqui não seja encontrado em mais lugar algum da internet, muito menos em língua portuguesa. 

Se você já leu discussão semelhante, com respostas similares ou não, sinceramente eu desejo muito saber. Mande-me o link.

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